sábado, setembro 13, 2014

O moinho da praxe

Num programa muito interessante da LVTV sobre moinhos no Algarve, descrevia-se o moinho como um sistema de movimento contante quando, propulsionado por velas movidas a vento, com engrenagens que ligavam e transmitiam este movimento ao de uma mó, em que o objetivo era mover a mó para esmagar os grãos de milho ou trigo e assim fazer farinha.
Podemos imaginar as praxes como um sistema semelhante. Começa um novo ano letivo e começam as praxes. É um movimento contínuo, uma engrenagem que não para. Uma roda dentada em movimento em que outras rodas encaixam, sendo que as rodas pequenas, os praxantes, obedecem às rodas grandes, os dux e companhia, num movimento constante e imparável, ao sabor do vento. Todo este sistema tem como objetivo moer uns grãos, os caloiros, que saiem já feitos numa farinha que será amassada pelos professores para fazer o pão. Se daqui sai um bom pão, é o que é discutível.
Farinha não será a melhor para fazer um adulto com ideias próprias, iniciativa e que analise e discuta ideias. Serão soldados prontos a receber ordens, receber matéria sem questionar, com o objetivo de alcançarem o fim do curso e obterem o tão desejado diploma.
O vento pode ser forte, com praxes que violentam os caloiros, humilhando-os, tornando ainda mais provável a  sua submissão e deixando marcas na sua personalidade. Pode-se argumentar que quem sobrevive se torna mais forte. É provável. Esta é a lei da selva e se esta é a lei que governa as praxes, então está tudo dito. O vento pode ser menos forte e as praxes serem educativas, com atividades coletivas em que todos fazem parte da engrenagem. No entanto há sempre alguém que por ter sofrido em anos anteriores a praxe, quer retribuir na mesma moeda e não permite estas facilidades, ou então é um bully que só tira prazer de humilhar outros mais fracos que ele. Estes moinhos de praxe, localizam-se em espaços supostamente onde se cultiva a cultura, ciência e a evolução do indivíduo. Não pode haver maior contradição.

sexta-feira, setembro 05, 2014

Mais um golpe numa classe profissional aparentemente indiferente

Ontem em entrevista num canal de televisão o Presidente do Sindicato Nacional do Ensino superior, António Vicente, disse que nos últimos 3 anos os cortes foram de 31%. . Perante a questão de que este ano são só de 1,5% o que seria um pequeno sacrifício perante os sacrifícios dos restantes setores do Estado e do país, o entrevistado disse que era grave este corte porque não havia mais margem de manobra devido aos cortes anteriores. Não sei se esta foi uma boa resposta, uma vez que quem acomoda 31% também acomoda 1,5%, dirá alguém menos atento. A questão é que o que o entrevistado não disse como resposta, embora o tenha referido anteriormente mas sem convição, é que a este corte acresce ainda os cortes nas bolsas de investigação e nos cortes baseados numa avaliação dos centros de I&D que poupará à FCT outro tanto sobrecarregando as Universidades, mais que aos politécnicos, com verbas desviadas para os centros que necessitem de honrar os seus compromissos. Há ainda a considerar os aumentos dos funcionários públicos, incluindo os professores, nos meses pós-chumbo da troika nos cortes dos salários. Penso que o grande problema dos professores do ensino superior perante o governo, é não terem nem um sindicato à altura de os defender, e já agora, nem um conselho de reitores à altura. Os reitores também não convencem que estão determinados quando ora dizem que não podem apresentar orçamentos com estes cortes, ora dizem que o farão após um fim de semana supostamente de telefonemas do ministro a insistir na aceitação deste corte.
Os próprios professores não estão à altura de se defenderem, uma vez que para além de não estrem unidos, são pessoas que não pensam em reivindicar seja o que for, e aguardam serenamente que venha o ordenado ao fim do mês. Só se escandalizam quando o seu centro não foi selecionado para financiamento ou um seu aluno não tem bolsa. São de facto muito altruístas ou pura e simplesmente indiferentes.

sábado, agosto 23, 2014

O Algarve que (não) temos

Perdeu-se algures o espírito do Algarve de outros tempos. Aquilo que era mais apetecível, as praias, tornou-se num mar de gente ávida de ocuparem a areia ou as espreguiçadeiras dos hotéis e num dormitório temporário dos chamados turistas de massas. O Algarve já foi orgulhoso com as suas praias pristinas e os seus produtos originais, separado do resto do país por uma barreira natural, a serra do caldeirão, que noutros tempos o tornava suficientemente isolado para os que lá moravam se sentirem algarvios e os que se aventuravam pela serra para passarem um mês de férias numa pensão uma numa casa alugada se sentirem turistas na sua terra, usufruindo dos bens locais e interagindo com os residentes algarvios.
Agora parece o inverso. Comunidades de turistas do norte da europa, sendo os britânicos a maior colónia residente de estrangeiros, vivem num mundo à parte, relacionando-se quase exclusivamente uns com os outros, comprando em lojas também deles, utilizando de preferência os seus conterrâneos como fornecedores (construtores de piscinas, talhos, etc). Muitos não pagaram os impostos que os locais tiveram que pagar na compra da casa e nem pagam IRS. Vivem numa região e num país para a qual pouco contribuem. No entanto quando necessitam de cuidados de saúde utilizam os hospitais públicos além dos privados, um serviço pago por todos os portugueses. Não sei se pagam IMI sequer. Muitas das suas casas forma compradas por off-shores fugindo desta forma aos impostos. Tudo isto com a complacência das autoridades. No inverno os turista são outros: os idosos de países do norte da Europa que se estabelecem nos hotéis a preços abaixo do que pagariam de contas de eletricidade nos seus próprios países. A hotelaria habituou-se nas últimas década de tal ordem a estes clientes, que os clientes de verão, muitos portugueses, têm que gramar com comida ao gosto dos ingleses e outros estrangeiros europeus, que têm por base alimentar o borrego assado, o filete de peixe tipo perca, os "beans", a salsicha, etc. A gastronomia portuguesa está remetida para um dia em que se anuncia qualquer coisa como sardinhas assadas ou outras coisas menos nobres da nossa gastronomia. Mais uma vez tudo para que os portugueses se sintam estrangeiros na sua própria terra.
Claro que também há os hotéis de 5 estrelas e os restaurantes com 1 ou até 2 estrelas Michelin, ou as "villas" em condomínios mais ou menos fechados. Mas nesses os algarvios só entram como ajudantes de cozinha ou empregadas de limpeza e de quartos, muito como o fazem na Suíça e França, pelo que podem ser considerados como parcelas dessas economias mais evoluídas em território nacional. Só falta pedir o passaporte para ter poder entrar em alguns desses locais (veja-se por exemplo Vale de Lobo com segurança privada em todo o resort). Há ainda os letreiros em inglês, os pubs, o turismo de habitação pertencente a estrangeiros que angariam pessoas do seu país, enfim, toda uma economia paralela que foge em grande parte ao controlo das autoridades e principalmente ao controlo político regional.
A sazonalidade no Algarve é outro problema. Uma região quase totalmente dependente do turismo, não consegue dar aos seus naturais trabalho fora dos meses de estação alta. Não se investiu em mais nada que não o turismo, muito incentivado por programas de incentivos europeus. As pescas pelo contrário, desde o tempo de Cavaco Silva como primeiro ministro, ele próprio um algarvio, que se veem abatendo barcos em troco de subsídios para não se fazer nada.
Com o continuar da crise nacional e o poderia económico dos norte-europeus, e com a sua continuada vontade de viver em países do sul da Europa, devido ao seu clima, ou o Algarve dá uma grande reviravolta e se protege, pela mão dos algarvios conscienciosos e do governo, ou os outros, turistas e parasitas, incluindo alguns algarvios oportunistas, o virarão do avesso, se é que já não o fizeram, transformando-o num conjunto de kibutzs de vários países do norte da Europa, com predominância para o britânicos, ficando os algarvios remetidos a uma faixa "de Gaza". Afinal, muito antes da existência da faixa de Gaza,  foi assim que se fundou o estado hebraico, pela mão dos britânicos.

quarta-feira, agosto 20, 2014

Mais cortes no orçamento do ensino superior

No período de férias, eis que surge mais uma noticia de cortes por parte da tutela, desta vez 1,5%. Muitas instituições não conseguirão compensar estes cortes gerando receitas que há uns anos propagandeavam que faziam através e projetos europeus e receitas próprias em projetos de I&D.
O melhor seria não declarar as receitas próprias para desse modo ir buscar mais financiamento? Nesse caso foi um erro a UM inflacionar as receitas próprias com orgulho há um par de anos atrás, reclamando que constituiriam mais de 50% do total daas receitas, incluindo por exemplo receitas de projetos europeus que provêm da cobrança de custos indiretos, como receitas próprias. É como um senhorio  receber rendas e ser considerado produtiva essa receita.
Noutra componente dos cortes, estão os seus professores e funcionários que voltarão a ter cortes, e os cortes nas bolsas e nos centros de investigação.
O Ensino Superior nunca foi tão atacado como agora. Terá que se defender, e se reinventar. Não basta fazer o mesmo que sempre tem feito, ensino e investigação. Tem que se ligar ao exterior, com aas empresas, e deixar que esta ligação não seja só um slogan mas uma realidade.