quinta-feira, maio 26, 2011

A Fundação: regime de contratações e promoções

É sabido que no nosso País funciona e funcionou sempre a cunha. Uma palavrinha, uma ligação familiar ou de amizade ou de outra natureza, e o emprego ou a promoção estão garantidas. Acontece nas empresas e acontece na função pública. Todo o País depois sofre na sua competitividade por muitas vezes não serem os melhores em cargos de chefia, ou mesmo que não sejam de chefia mas suficientemente relevantes para "atrasar toda a máquina" ou numa designação muito mais apropriada em inglês: "slow down". Os sociólogos teriam muito a estudar sobre esta apetência que os homens e mulheres têm para se sentirem poderosos ao ter nas suas mãos o destino de alguém, e de daí tirarem prazer ao decidir sobre o seu emprego e futuro profissional.Também sobre os candidatos que se sujeitam a essa arbitrariedade este estudo faria um bom "case study" em termos da aceitação de ficarem a dever favores ao seu chefe e de futuro ter que "pagá-los".
Na função pública, quando um governo introduz uma lei mais exigente de concursos para admissão ou promoção de pessoal, é com o objectivo de reconhecer o mérito na avaliação. No entanto há uma tendência recente de se confundir competitividade com agilização de processos de contratação e de promoção. É o caso da transformação da Universidade em Fundação, em que todos estes processos de contratação e de promoção serão muito mais simples e rápidos. Pode de facto haver a coincidência de se contratar alguém muito capaz que imediatamente põe as suas capacidades de trabalho ao serviço da instituição e tal como em muitas empresas de sucesso, potencia a produtividade da secção para onde foi trabalhar ou onde foi promovido e indirectamente contribuir para a produtividade da própria Universidade. Mas em muitos casos pode também funcionar a cunha ou a proximidade, familiar ou outra, uma vez que é uma condição que não desapareceu nem desaparece tão cedo da sociedade portuguesa. No caso da promoção de funcionários, já temos o exemplo do SIADAP que permite aquilo a que se designou por Opção Gestionária, mas que bem se podia designar por "opção discricionária" pelas injustiças que causa ao passar ao lado da avaliação objectiva regular. No caso dos professores, o ECDU ainda vigora com exclusividade da promoção por via duma avaliação por concurso. Com a passagem da Universidade a Fundação, vai haver também a possibilidade de passar ao lado do ECDU, o que poderá também gerar situações de injustiça. Vamos esperar para ver, porque se as dúvidas ou mesmo rejeição de muitos professores da passagem a Fundação já são muitas, então serão muitas mais nessa altura, o que poderá provocar uma alteração do sentido de voto nas próximas eleições para os cargos dirigentes da UM, uma vez que os actuais dirigentes são os protagonistas desta mudança.

domingo, maio 15, 2011

Desvalorização dos graus em Engenharia

Mestrado? Doutoramento? São palavras que em tempos eram raras no quotidiano português mas que agora são comuns, o que seria exclusivamente motivo de orgulho para o nosso País, mas que são também motivo de preocupação pela sua aparente desvalorização. Senão vejamos. Para ingressar no Mestrado já não é necessário como era antes de Bolonha nota de 14 ou 13 com um bom currículo, e na Engenharia, no caso dos Mestrados Integrados, é uma continuação dos primeiros 3 anos, que conferem o grau de licenciatura. É preciso que se recue aos primórdios de Bolonha para nos lembrarmos que as licenciaturas eram para ser por si só o grau de ingresso no mercado de trabalho, com o objectivo de encurtar esse período de aprendizagem tornando-o torná-la mais virado para Mercado. Todos sabemos o que fizemos dessa ideia: foi para o lixo porque não interessava ao Ensino Superior ter os alunos menos anos na instituição com a consequente perda de receitas para as Universidades. Assim, desvalorizando a licenciatura, sobrecarregando-a de matérias que não interessariam ao potencial empregador, forçam os alunos a continuar para Mestrado para assim poderem ter aceitação no mercado de trabalho, e facilitam também essa transição integrando o grau de licenciatura em Mestrado Integrados.
Por sua vez, esta massificação de Mestrados, para além de desvalorizar o grau, força os alunos a pensar diferenciarem-se da concorrência, pensando em prosseguir para o doutoramento. A Universidade agradece e facilita essa transição: para ingressar no programa doutoral também não é necessário nota de 14, ou Mestrado com classificação de Muito Bom como era antes de Bolonha. Os Doutoramentos são agora programas doutorais, em que, tal como no Mestrado, têm um ano com aulas em matérias de "adaptação" à àrea do doutoramento e aulas em matérias de preparação para a investigação. Tudo muito lógico, mas perde-se um ano de investigação. Portanto temos o programa doutoral com menos um ano de investigação no doutoramento.
Em termos de capacidade dos doutorandos para a investigação, como consequência dos anos iniciais da licenciatura sem aulas de preparação de prática laboratorial, substituídas que foram em muitos casos por teoria e por trabalhos em computador (com recurso a motores de busca e enciclopédias on-line), temos a má preparação laboratorial dos alunos, mesmo daqueles que entraram com notas superiores a 14, indispensável para cumprirem um doutoramento.
Será normal que os supervisores façam que tudo seja possível fazer no curto espaço de tempo que têm para cumprir o calendário, não querendo dispensar no seu currículo mais uma orientação de um doutoramento.
Exagerado este cenário? Gostava que o fosse, mas teriam que me convencer do contrário, com factos e não "pedagogia", que é o que não falta na nova realidade que é Bolonha.

sábado, maio 07, 2011

A inércia do sistema perante sintomas preocupantes

Surgem ciclicamente mensagens de alguém que sente que foi marginalizado pelos seus superiores ou mesmo colegas, como foi o caso desta semana de Joaquim Sá do IE-Instituto da Educação. Conheço o Joaquim e conheço os seus problemas por alto, mas não conheço toda a história por detrás de tanta amargura. Sei que terá as suas razões, porque sendo um professor profundamente honesto , não conseguiu no entanto progredir na carreira tal como desejava. Assistiu durante anos à progressão de outros que não reconhece como tendo um currículo superior ao seu, ou pelo menos que não tem um currículo que lhe pareça em linha com as directrizes do que é normal nas Ciência de Educação. Para um leigo nesta área como eu, também fico surpreendido como currículos de biologia e áreas afins chegam a Professor Catedrático em departamentos onde supostamente “se ensina a ensinar”, havendo ainda por cima outros com currículo em áreas mais de acordo com a Educação em geral como é o Ensino de crianças, que é aparentemente a área do Joaquim, que ficam pelo caminho.
A frustração de ninguém lhe responder a estas questões, que lhe parecem anómalas, levou-o ao desespero e a tomar atitudes que muitos reprovam, como o de divulgar textos que chegam a insultar quem percorreu esses caminhos paralelos à Educação como o seu colega Nelson Lima, ele próprio eventualmente uma vítima do sistema, que como denuncia o Joaquim, “anicha” professores onde existe vaga, independentemente do seu currículo ser aquele que mais interessa ao fim em vista: neste caso a Educação. Também não aprecio esta forma de protesto que procura envolver todos os membros da comunidade académica num assunto que eventualmente não poderão julgar com isenção por não conhecerem toda a envolvente, e que por isso castiga quem não esperava tal ataque quando inocentemente divulga o que tem construído ao longo dos anos na UM, ou seja uma Micoteca, que sem dúvida tem muito interesse e mérito, embora talvez não para o Instituto de Educação, pelo menos directamente. Dito isto, também compreendo o grito de revolta do Joaquim, que entendo não como um ataque ao seu colega, mas mais um grito contra o sistema que o usou e o "cuspiu" quando ele se tornou incómodo. Infelizmente há vários casos destes nas Universidades, não só na UM como é bom de ver, e não há quem se interesse e procure resolvê-los. Para os alunos há o Procurador do aluno, mas infelizmente para os professores isso não existe.
Amigos Joaquim e Nelson, que não tenho o prazer de conhecer, como os compreendo! O Joaquim por não ter sido reconhecido o seu mérito, o Nelson que fez algo que ninguém lhe pediu para fazer, uma Micoteca, o que na Função Pública é invulgar. E se o fez por vias paralelas é porque não o poderia fazer por outras vias. Mas por favor, o vosso inimigo é o mesmo por isso não se digladiem mutuamente. Antes combatam o sistema juntos. Vejam como se originou toda esta confusão de critérios e exponham essas incongruências juntos, sugerindo rearranjos de sub-unidades orgânicas ou mesmo Unidades orgânicas de modo a que todos no futuro tenha uma vaga onde poderá correctamente se “anichar”, sem usar o nicho alheio.
É minha convicção e já a exprimi aqui neste espaço, que a UM já devia ter feito esse estudo global, reorganizar-se em novas e restruturadas unidades e sub-unidades. Não o faz para não mexer nos interesses instalados e como consequência temos casos como este, que imagino ser só a ponta do iceberg.