sábado, novembro 07, 2009

Engenharia à Bolonhesa?

Chamou-me à a atenção este artigo de opinião de um aluno do curso de Engenharia Mecânica da UM, referida no blogue Universidade Alternativa, e que foi publicado no Expresso na secção dedicada ao ensino universitário.
É no mínimo curioso, para não dizer embaraçoso, que foi preciso um aluno alertar para a selva que é a panóplia de cursos de engenharia no período pós-bolonha, em contraste com a indiferença mostrada pela tutela e pela maioria dos docentes de engenharia. Embora seja um artigo jornalístico de um blogue e nada mais que isso, não abordando o assunto como um estudioso da matéria o faria, o aluno toca no essencial duma forma desassombrada, sem complexos, o que é difícil de encontrar nos textos de docentes que já se debruçaram sobre Bolonha, que, criticando todo o processo, não põem no entanto em causa directamente os cursos mas mais a forma como se estão a leccionar (não deixam de ter razão quando criticam a forma muito superficial como são abordadas as matérias neles leccionadas).
Concordando com o autor do artigo, penso que o problema deve ser atacado na raiz e não só em falhas de currículum, sendo que os cursos de primeiro ciclo devem todos ser de banda larga, ou seja, de preparação para um segundo ciclo profissionalizante, não pondo no entanto de parte que haja algumas opções mais tecnológicas para o aluno ter algumas ferramentas que possam ser úteis na sua vida profissional, no caso de se ficar pelo primeiro ciclo. Como exemplo, o primeiro ciclo seria de Ciência de Engenharia, e teria opções no 3º ano dirigidas aos vários cursos de Engenharia existentes na UM, Engenharia Civil, Mecânica, Têxtil, Sistemas, Gestão Industrial, Materiais, Polímeros, Electrónica e Informática, por exemplo (não sendo de excluir outras).
O autor do artigo acaba por não acreditar que seja fácil implementar um sistema deste tipo, por se tocar em interesses instalados. Claro que todos já percebemos que esta é a razão principal para não se avançar neste sentido.
Ao perpetuar-se a situação existente, mantida pelos próprios professores representados pelos seus Departamentos, para no fundo manterem o número de horas de aulas a que estiveram habituados desde o início da sua carreira e que garantem de certa forma o seu lugar na instituição, continuamos com uma situação desajustada aos desígnios dos alunos, que pretendem ter uma formação que lhes forneça a possibilidade de terem um emprego, e desajustada às necessidades do País que não tem uma indústria nem serviços (saúde, ensino..)para os licenciados dos cursos existentes. Quem hoje entra, por exemplo, num curso com o prefixo Bio, tão popular entre os jovens, terá muita dificuldade de encontrar emprego ao sair do curso de cinco anos. Neste e noutros cursos, deve-se ponderar o desperdício dos anos que o/ aluno/a "gastou", numa fase importante e mais activa da sua vida, quando podia tê-los gasto num curso que pudesse escolher, ao fim do primeiro ciclo de três anos, com mais cuidado tendo em conta as saídas profissionais. Ou podia saír logo ao fim do primeiro ciclo, arranjar um emprego indiferenciado, e deixar para mais tarde fazer o segundo ciclo quando já estivesse numa indústria ou serviços em que o curso Bio, neste exemplo, fosse útil para a sua progressão no seu emprego. O exemplo clássico da dificuldade de colocação é o da indústria tradicional como a têxtil, mas nos tempos que correm, todos os sectores são difíceis, e o que hoje parece uma certeza, daqui a cinco anos estará sem perspectivas de emprego. A flexibilidade e a possibilidade de decidir o mais tarde possível qual a especialidade a escolher, são pois a via mais aconselhada.
Os professores das várias especialidades devem pois submeter-se a um desígnio acima dos seus interesses pessoais, nem que este desígnio seja imposto top-down, e se alguém tem que se adequar aos novos tempos são também os professores, pois no que respeita ao ensino, as Universidades existem para os alunos e não para os Professores. Os alunos (ou os seus pais) pagam para os alunos se formarem e os Professores recebem para os formar. É tão simples como isso. O Estado paga a dobrar: para os professores e para as bolsas dos alunos. Há ainda a componente de investigação, mas só por si não justificaria a existência das Universidades.
Embora pareça radical, penso que tal com para o Ensino Secundário, não se deve deixar a solução só com os Professores, Os pais, e entidades externas ao ensino, tais como gabinetes especializados em estudos de Mercado, devem ser chamados a decidir qual o melhor sistema de ensino, a forma com está estruturado, quais e quando devem ser leccionadas as áreas específicas, e as outras actividades que devem fazer parte dum curso, como a componente prática, a de gestão, as línguas e a cultura geral, necessárias ou não para os cursos em questão.
Só assim se sai deste ciclo vicioso de faz-de-conta que se faz mas não se faz aquilo do que estava previsto com Bolonha: cursos mais curtos e adequados ao mercado, isto é, um mercado de trabalho sempre em mudança!