sexta-feira, janeiro 31, 2014

A inevitablidade das praxes no atual contexto das universidades

As praxes entraram no quotidiano estudantil há anos com todos os abusos conhecidos que se praticam em seu nome. Já quase tudo foi dito nos últimos dias sobra a praxe. Esvaziou muito do que se poderia dizer nesta altura, muito por causa da tragédia ocorrida a praia do Meco recentemente. Não havendo mortes, não havia discussão. Mas mesmo assim nota-se um silêncio ensurdecedor por parte das associações de estudantes e das reitorias das universidades. Não há tomadas de posição enérgicas como se esperaria que houvesse.Talvez porque se sentem impotentes ou no caso dos reitores talvez porque são demasiado respeitadores da autonomia dos estudantes. Que relação existe e que acordos existem entre a administração das universidades, reitor e conselho geral, e as comissões de praxes? Algum acordo deve haver para a organização das praxes uma vez que elas ocorrem dentro dos campi. No entanto esses acordos não são conhecidos.
Para um aluno que entra numa Universidade e é confrontado com grupos organizados de alunos mais velhos, estando ele sozinho, que pode ele fazer senão submeter-se às ordens desses grupos, autodenominados comissões de praxe, subcomissões, sub-subcomissões e por aí fora, desde o 5º ano até ao segundo ano?
Para acabar com as praxes teria que haver uma proibição total de praxes no campus para começar. Em segundo lugar não deve haver receção aos alunos por alunos mais velhos, porque esse é uma forma de passar ao passo seguinte que será o encaminhamento dos alunos para as práticasdas praxes por infiltração nessas receções dos praxantes. É um pouco como a infiltração de grupos nazis nas claques de futebol. São ambos parasitas que aproveitam o momento para atuarem.
Os professores que tanto gostam destas receções são eles também, ingenuamente, ou não, veículos da transmissão de um sentido de impunidade dos alunos mais velhos. No caso da UM, muitos dos lugares chave da Universidade que lidam com os alunos, nos SASUM etc, são ocupados por ex-alunos que foram eles próprios líderes de comissões do género no âmbito das suas atividades na Associação Académica. São estes muitas vezes a face da autoridade da Universidade, envolvidos há anos em atividades estudantis com os mesmos que dominam as praxes. Como vai um aluno recém chegado reagir perante tal rede organizada e interligada por interesses do mais variado tipo: desportos, festas, subsídios, alojamento (residências), transportes, internet, farmácias, parques, etc. Por sua vez, existe uma presença elevada dos alunos da Associação Académica, ou quem eles lá colocam através de eleições pouco concorridas, no Conselho Geral que por sua vez elege o reitor.
As Associações Académicas, que por muito que digam que não têm nada a ver com as praxes e com as comissões das praxes quase ninguém acredita, porque não teriam a força que têm se não houvesse promiscuidade entre ambas, têm um poder exagerado nos órgãos da universidade e essa é uma das razões porque as praxes não acabam tão cedo.
As outras razões já foram discutidas: é uma forma de protagonismo coletivo dos mais velhos, que por terem uma capa ostentam-na como se um tecido preto significasse alguma coisa. Não a ganharam, compraram-na. Os professores para usarem uma coisa semelhante, o traje, tiveram que prestar provas. Os alunos não. No entanto parece da forma como a ostentam em frente dos caloiros, que ela foi ganha. Só se foi ganha por terem já sido praxados! Nesse caso, se é essa a perceção dos vários intervenientes, os caloiros aspiram a no ano seguinte poderem também a vestir, para também eles poderem ter esse estatuto que eles sentem como poder absoluto (e sentem-no na pele!).
Estamos perante um fenómeno muito parecido com aquilo que se passa em colégios internos, que têm uma hierarquia entre estudantes. Mas as praxes agravam esta hierarquia com pequenas malvadezes que só diferem de bullying por serem perpetradas em grupos de estudantes e não individualmente. O bullying pelo menos psicológico, vem a seguir, sobre aqueles que não integram as praxes. Por isso penso não ser possível permitir praxes de brincadeira e só proibir as violentas e humilhantes, como tem sido sugerido por algumas Associações e alguns reitores, incluindo o da UM,  ao quererem fazer algo para minimizar os danos. Não é possível distingui-las objetivamente, a meu ver. Que as reitorias façam o seu dever e proíbam no campus quaisquer praxes e se os estudantes querem divertir-se que o façam sem a tutela dos mais velhos, porque está visto que os mais velhos se aproveitam da fragilidade psicológica que estes alunos se encontram quando entram na Universidade pelo facto de estarem num meio que desconhecem e não têm aliados. Aqueles que deveriam ser os seus aliados, os que ocupam cargos de relevo na instituição para os proteger não o são objetivamente. Para começar, o procurador do aluno deve ser extinto por não os proteger ou não ter a capacidade de os proteger. Para substitui-lo, cada aluno do primeiro ano poderia ter um tutor escolhido entre os professores do seu departamento. Seria alguém a quem o aluno pudesse recorrer. Lá fora, pelo menos na Universidade onde estudei, existe esse sistema. Uma coisa é certa, muitos de nós professores também nos sentimos impotentes por não atuarmos. Poderia ser desta forma ou de outra. Não podemos é desistir e deixar estes alunos indefesos. Para bem da nossa memória coletiva e do futuro desses alunos, praxados e expraxados/praxantes, como pessoas de mente sã.

quarta-feira, janeiro 01, 2014

Mensagens de ano novo

Já nos habituámos a receber mensagens de Natal e Ano Novo em formato eletrónico, e-mail ou telemóvel, e de muito mais gente do que acontecia há uns anos atrás, devido à facilidade que as novas tecnologias permitem que isso aconteça. Recebemos na UM-net mensagens até de pessoas que não conhecemos, por essas mensagens serem enviadas para listas, do género todos@. Quando se trata de um diretor de departamento ou Escola ou da reitoria, é natural. Pensamos que os que estão nesses lugares querem nos dar algum conforto sobre o ano que se adivinha. Quando são colegas do mesmo departamento aceita-se que esses votos são sinceros, por convivermos com eles no dia a dia. Mas quando são colegas de outros departamentos que mal conhecemos seja pelo nome ou pessoalmente? Mas quando são colegas que não detêm qualquer posto de gestão no momento em que envia a mensagem? Que dizer de mensagens que não só são universais, dirigindo-se a todos, mas que divulgam nomes de colegas que o autor da mensagem acha que merecem particularmente ser mencionados, pelo que têm alcançado em I&D, desejando-lhes a eles em particular mais sucessos no futuro ano? Que dizer se essas mensagens são de alguém que não detém um cargo de gestão mas que já a ocupou e que escolheu o momento depois de o deixar em vez de o ter feito durante? É conhecida a atitude de alguns envolvidos na gestão ou em equipas de investigação, o seu pudor compreensivo, quando não querem particularizar ninguém de um grupo, sob pena de ser injusto e deixar alguém de fora. Ora, parece que esse pudor desapareceu. Parece que não existe etiqueta ou boas maneiras neste capítulo. Nestes casos, percebe-se a falta de homens com um sentido de Estado, sentido do dever, mesmo que o "estado" seja só uma parcela desse estado, como por exemplo uma universidade, e só transmite para o exterior uma imagem de uma instituição de província que não consegue preencher esses lugares do topo com gente com o sentido do dever e da contenção, mas que só o consegue com gente com o instinto do que pode lucrar pessoalmente por via da sua posição no topo da hierarquia académica. Muitas vezes esses cargos de gestão, tal como cargos políticos, permitem os detentores desses cargos de conseguirem contactos que mais tarde lhes serão úteis para ocuparem cargos muitas vezes designados por "tachos". E esse trabalho de autopromoção pode continuar mesmo depois de deixar o "governo", entrando pelo novo ano adentro, com mensagens que muitos de nós dispensaríamos. Eu falo por mim e espero que esses auto-convencidos "opinion makers" me tirem da lista quando as enviarem para todos@ !

domingo, dezembro 22, 2013

Discrepâncias do ensino público

Mais um ano a acabar e o Ensino Superior com cada vez mais preocupações para o futuro. O financiamento é a principal preocupação as há ainda a baixa no número de alunos que se verificou este ano e que não se perspetive que melhore. O descrédito na empregabilidade de um curso superior será a principal razão mas a crise que impede que muitos alunos de famílias em dificuldades frequentem o Ensino Superior é outra razão . E aqueles no interior do País estarão pior por terem que suportar, ou os seus pais, custos da sua estadia e viagens. Tudo isto é sabido e não merece mais que um encolher de ombros tanto pela aparte dos governantes como da generalidade da população. Por outro lado muitos cursos estão desajustados ao tecido empresarial, não sendo possível atribuir culpas só para um lado, ensino ou empresas, uma vez que ambos têm culpas. Os professores vivem do seu salário e o seu lugar a médio prazo depende do número de horas letivas. Por isso é natural que se defendam e se direcionem para áreas populares, que sabem que atraem mais alunos, aumentando o número cláusus não tendo em atenção a empregabilidade dos seus alunos. Não havendo no país empresas suficientes para todos estes licenciados, em áreas como a biologia, engenharia biomédica, engenharia biológica, gestão, direito, humanidades, educação e agora mais recentemente engenharia civil, porque se insiste em números cláusus tão elevados para estas áreas? Ao menos a engenharia têxtil já há muito que não ultrapassa os dez a quinze alunos, muito devido á impopularidade do setor espelhado nos meios de comunicação, havendo por isso uma oportunidade para os seus alunos terem acesso a um emprego na indústria.
A ideia do ministro de cursos mais curtos nos politécnicos, cursos de dois anos, se fossem cursos práticos, até que não é má ideia. Agora não exigindo o 12ºano, baixa logo o nível o que não é o que os empresários de empresas evoluídas querem, e não tendo os recursos em termos laboratoriais, ou parcerias industriais asseguradas, só pode ser mais uma medida avulso "sem pés para andar". Esperemos que me engane, a bem dos nossos jovens e das nossas empresas.
Também há o risco de estarmos a formar pessoas para serem soldadores e eletricistas no Luxemburgo, França ou Suiça, como já aconteceu com os cursos profissionais.
Mas não havendo alternativa, tem que haver ensino intermédio neste país, que tanta falta faz.
Em contraste com este nível de aplicação tão imediata, temos os cursos de doutoramento ou doutoramentos que proliferam, e que não são aproveitados pelas empresas, na sua grande maioria.
Li na imprensa que os jovens irlandeses estão a voltar à agricultura, e os islandeses à pesca (hoje no Público), fruto da crise porque passaram as profissões "de gabinete" durantes estes últimos anos de crise. Em Portugal também já se ensaiam alguns passos nesse sentido. Será uma alternativa digna para os jovens com essa vocação e talvez o país saia do buraco em que se meteu com a PAC desde que entrou para a CE e que simultaneamente como medida compensatória, que nós aceitámos como país subdesenvolvido que éramos, aliciou jovens a fazerem cursos de formação profissional que se percebeu eram mais uma forma de financiar monitores, consultores e os próprios alunos que tanto mal fizeram ao país, fazendo o país perder tempo, que era precioso para o país sair do atraso em que estava. O ensino secundário não ajudou com alguns (quantos?) turbo-professores a ensinar o pouco que aprenderem nas instituições superiores mais preocupadas em elas próprias terem alunos/professores. Por muito que me custe, até concordo com o ministro nesta tentativa de por alguma ordem nesta imensa vaga de professores que "assaltam" anualmente os poucos lugares vagos que existem. Quais os critérios de admissão? No ensino superior era e é a média, sendo que há uma avaliação prévia que se chama doutoramento. Quando é que os professores do ensino básico e secundário percebem que a avaliação é sinónimo de qualidade?
Claro que não pretendo que será esta avaliação que se tornou numa farsa (porquê só os contratados e desses aqueles que têm menos de 5 anos de profissão?), mas é que eles não quiseram nem querem nenhuma avaliação. E deste modo os pais que podem põem os seus filhos no privado, colégios em Lisboa, Porto e Coimbra, ficando o resto do País e os outros pais desses distritos que não têm posses, dependentes de um ensino público nos últimos lugares do ranking.
E então para piorar o ensino público afastam-se os melhores alunos com o cheque-ensino ! Será que ficará alguma coisa de pé no ensino público com toda esta confusão (por parte dos professores) e desmantelamento (do governo) quando acabar este período de insanidade coletiva?