sábado, maio 12, 2012

O campus e a cidade

Uma das raras ocasiões em que o campus vai à cidade em força é na semana do cortejo académico. Embora já não vá há muito tempo, admito que seja um momento divertido em que o cidadão comum vá ver o espectáculo promovido pelos estudantes, como se de um divertimento se tratasse. O bom humor impera e como é tradicional e natural num evento destes e também a irreverência. A instituição costuma dar o se apoio e também conferir legitimidade académica ao cortejo, nomeadamente o reitor com a sua presença. Consta que este ano a presença do reitor foi curta e que rompeu com uma tradição que vem sendo habitual e que virou as costas aos alunos que o mimaram com umas sátiras à sua actuação em relação à prática da praxe. Falta de sentido de humor? Falta de "poder de encaixe"? Como costuma dizer o comentador Professor Marcelo Rebelo de Sousa: o reitor não esteve bem. Já há muito que tinha notado que estas falhas constituiriam o calcanhar de Aquiles do reitor, imperdoáveis numa posição como a sua, uma posição que deve representar o que de melhor os académicos demonstram ter, de uma maneira geral, ou seja o sentido de humor e o poder de encaixe. A sua tomada de posição em relação à praxe foi, quanto a mim, a mais positiva do seu mandato. Na verdade, temos assistido a um rol de obscenidades, e práticas de humilhação exercidas pelos mais velhos sobre os mais novos, os caloiros. Nada justifica esta actuação quase que militarista, muitas vezes reminiscente das práticas dos comandos, e de outras forças especiais como que a testar os futuros soldados em terreno de batalha, a sua resistência e "endurance". No entanto, alunos não têm necessariamente que ser lutadores no sentido estrito da palavra. Já basta o que os jovens têm que enfrentar quando se candidatam a um emprego e que segundo as estatísticas são sujeitos cada vez mais a tudo e mais alguma coisa, desde a pressão psicológica típica dos “call centres” até ao assédio a que são sujeitos por empregadores sem escrúpulos que agora mais que nunca, aproveitando-se da crise, os exploram até ao tutano. Eles não precisam que lhes iniciem nesse caminho da humilhação mas sim de um estímulo e de encorajamento para a vida que está à sua frente. Ora, dito isto, nem tudo é mau nas tradições estudantes e há também a componente saudável do convívio que a semana da queima/enterro da gata proporciona e que de alguma forma serve para desanuviar dos estudos e prepararem-se para os exames que vêm aí. O reitor pelos vistos não sabe distinguir entre estas duas formas de manifestação de irreverência. Uma raiando o insultuoso, como é o caso das praxes, a outra, divertida, caso do cortejo. Faltou aqui o sentido de humor. Faltou também o poder de “encaixe” à crítica. Quem quer ser reitor actuante e toma medidas populares junto dos professores, mas impopulares junto de muitos alunos, como em relação às praxes, tem que estar preparado para as críticas. Ninguém está acima da crítica. Nem o reitor, nem o Presidente da República. Tanto num caso como noutro, aos actuais detentores do cargo, falta-lhes aparentemente o sentido de humor e o poder de "encaixe". Terão outras qualidades para o cargo, senão não seriam eleitos. Talvez noutra ocasião eu tenha razões para as referir. E são bem precisas, com a crise que atravessamos.

segunda-feira, abril 23, 2012

A curva descendente do Ensino Superior

É normal que quando tudo parece ruir em redor do Ensino Superior, tal como no resto do País, não haja qualquer reacção a essa curva descendente? É o orçamento para as Universidades e Politécnicos que cada vez está mais baixo, são os alunos a sair por não terem bolsa, é a progressão na carreira congelada, é o facto de não se poder contratar mais ninguém, são os cortes nos salários e nos subsídios de férias e de Natal, é a ADSE a custar mais e a valer menos, em cima de todos os outros custos comuns a toda a população (IVA, transportes, reembolsos do IRS para a saúde e educação parados, etc.). Não reajam que o ministro do ensino superior e prinipalmente o das Finanças, agradecem.
Será que não há outra forma de resolver esta questão do défice a não ser cortar,cortar e cortar mais? Os partidos da oposição dizem que sim, mas os eleitores nas sondagens ainda dão maioria aos do governo. Porquê? Por muito menos, pelo menos em termos de cortes, foi ao ar o governo Sócrates. Será que estamos todos em negação por causa do Sócrates e por isso não reagimos, uma vez que achamos que estávamos todos do mesmo lado e se estávamos do mesmo lado não iriamos agora protestar contra aqueles que nos "salvaram" do Sócrates? Pelo menos a imprensa, começando pelo Correio da Manhã e acabando no Público, dão a entender precisamente isso. Mas ao olharmos só para o Ensino Superior, alguém duvida que estamos muito pior que no tempo do Mariano Gago, embora o criticássemos na altura? Podem dizer que foi com dinheiro que não tinhamos. Mas não nos podemos esquecer que só do BPN que não teve nada a ver com membros do anterior governo mas sim do governo do Cavaco, já lá vão 5,5 milhões de euros e esses não tinham como missão educar o País mas tão só encher os bolsos de uns quantos....Enfim, se não vamos reagir vamos ao menos seguir o conselho do Secretário de Estado da Juventude e do ministro Relvas e vamos recomendar que os nossos alunos emigrem, neste caso para outras paragens com o Ensino Superior intacto, porque a este ritmo não vamos ter condições para lhes dar uma formação superior condigna.

sábado, abril 07, 2012

A avaliação feita à medida de alguns

A avaliação segundo o RAD-EEUM (RAD da Escola de Engenharia), pode-se entender como auto-avaliação em 85% e avaliação em 15%. Embora o processo informático balize a auto-avaliação de I&D maioritariamente em publicações referidas no ISI W.O.K. e no SCOPUS, o que é uma forma correcta de assegurar uma avaliação comparativa entre os vários departamentos, o que acabou por prevalecer devido à pressão dos vários departamentos e centros de I&D foi que também fossem consideradas conferências que os centros considerassem de qualidade, mesmo que os "proceedings" não estivessem na ISI w.o.k. ou Scopus. Pode-se argumentar que nem todas as conferências são registadas nestas bases de referência internacional, o que prejudicaria certas áreas do saber menos mediáticas ou que não tenham a agressividade de certos promotores de conferência na ânsia de angariação dos melhores conferencistas. No entanto, não deixa de ser uma tentação para os departamentos e Centros de indicarem conferências em que mais participaram nos últimos anos, nomeadamente os que estão a ser avaliados, tenham ou não mérito internacional essas conferências. Devia ser para evitar esses abusos que há uma avaliação por parte de outro avaliador, um Professor mais graduado(Catedrático), e não só de um sistema automático que aceita tudo o que lá se mete desde que esteja na lista. Mas o que se verifica? É que o avaliador não pode alterar essa avaliação automática, mas tão só participar com uns meros 15% numa avaliação global. No futuro, podemos ter casos em que os avaliados acumulam pontos nas várias comunicações nessas conferências pré-escolhidas sem referência internacional, que quando somados vão valer mais que uma comunicação numa conferência referenciada nas bases de dados aceites por toda a comunidade internacional. É preciso dar ao avaliador a possibilidade de evitar esses abusos, sob pena de termos uma avaliação em boa parte deturpada.

domingo, abril 01, 2012

Prálem do Campus

O campus não é uma cláusura. É necessário ir para além do campus. Visitar empresas, fazer colóquios, apresentar a Universidade tal como ela é e como será daqui a uns anos. O ECDU está desactualizado. Tem a componente de avaliação desactualizada. Não é só com papers que se faz um Professor Catedrático senão ele não serve para a sociedade. Servirá para orientar os outros Professores, mas com a estrutura departamental tal como está definida, nem para isso serve. A interacção com a sociedade de um professor devia ser importante para a sua avaliação, mas não o é. Mesmo a sua intervenção política, leia-se política apartidária, devia ser objecto de avaliação. Política educacional, política regional, política empresarial, por exemplo.
Tenho dito.

sábado, março 17, 2012

A garra que nos falta

Vimos o Sporting bater um dos grandes do futebol europeu, o Manchester City. Com um plantel que vale dez vezes menos que o do adversário, conseguiu ganhar. E de que forma? utilizando a sua tática de um bom futebol técnico mas sobretudo como dizem do seu treinador, muita garra. Resistência e contra-ataque. Não será uma forma também do país resistir perante os milionários europeus e os especuladores que deitam abaixo o nosso rating? Resistir sim como estamos a fazer, e a que custo, mas também contra-atacar. Parece-me que é aqui que o governo não está a fazer nada. A nossa economia afunda-se a olhos vistos, o governo aceita todas as imposições da troika do FMI e da sra.. Merkel, e como um aluno bem comportado vai fazendo o que lhe mandam. Dos jogadores do Sporting o Manchester não conhecia ninguém. Agora já conhecem. De Portugal quem é que lá fora conhece alguém do governo? Pois é preciso darem-se a conhecer e quanto mais cedo melhor. Insistam na restruturação da dívida para maiores prazos e a juros mais baixos, mas não pedinchando. Eles que tenham respeito porque se nós lhes fecharmos a porta temos para onde nos virarmos, para África e eventualmente o Brasil e a Ásia. Há lá muito boa gente que gosta dos nossos produtos, como o vinho do porto, e de alguma da nossa tecnologia. É melhor aguentarmos um período mau de uns anitos do que pôr em causa todo o futuro dum país durante anos a pagar a dívida e os juros...e a morrer lentamente à fome, como a história do burro do inglês que tanto lhe reduziu a ração para poupar que o burro morreu de fome. Vejam a Islândia, a crescer 2,5% ao ano! E estava na bancarrota há 3 anos atrás. Porque não nós? Se nos "chatearem" muito até fazemos como eles. Só a ameaça já nos traria dividendos.
Por hoje não se fala do Ensino Superior porque não há nada a falar: está também sem garra.

sábado, março 10, 2012

Não façam nada demais

Temos cada vez mais uma sociedade que castiga aqueles que fazem alguma coisa. Não há muito tempo o betão era o alvo de todas as críticas. Fizeram-se autoestradas a mais sem dúvida, mas algumas que se fizeram dão muito jeito. Quem se lembra de ir a Viseu pela estrada antiga? Ou ao Algarve? Era um castigo. Agora são as obras que se fizeram nas Escolas. Talvez se tenha exagerado em algumas escolas com os materiais e há um famoso candeeiro que tem andado nas bocas do mundo. Mas alguém parou para pensar nas condições que os alunos têm agora em contraste com as que tinham há pouco mais de um ano? Basta aos mais velhos pensarem na escola onde os filhos andaram e que conheceram, nas reuniões de pais, em salas sem o mínimo de condições para as reuniões, e aos mais jovens de recordar o frio que passaram quando eram alunos. Havia reportagens de escolas onde chovia lá dentro! É tudo política e tudo serve para bater, escolhendo sempre o aspeto negativo. E se não se fizesse nada? Se o programa de melhoramento do parque escolar não fosse avante? Estaríamos satisfeitos que tínhamos poupado esse dinheiro? Passaram despercebidos anos do formação do Fundo Social Europeu em que se ensinava de tudo, e desde que os alunos recebessem e os monitores tivessem emprego, estava tudo sempre bem. O que é que ficou desses milhões que se gastaram desde 1986? Muito pouco. Esfumou-se. E atravessou todos os governos de todas as cores políticas! Mas as críticas não existem. Mas se uma escola foi intervencionada e lá alguém se entusiasmou e comprou um candeeiro desnecessário ou um material mais nobre, cai o Carmo e a Trindade. As Escolas e as estradas estão aí para ser usadas por futuras gerações. Mas e as "sebentas" dos cursos do FSE? Onde estão e para que servem?
Na Universidade também se adquiriram materiais nobres para algumas das instalações mais recentes. Mas as obras que se fizeram vieram melhorar muito as condições de trabalho tanto dos alunos como dos professores. No Ensino Superior numa perspetiva mais etérea, o que se fez em I&D que muitas vezes não tem consequências para a sociedade, é elogiado ao máximo enquanto que aquele professor que atende os alunos fora de horas mas não tem um currículo brilhante é muitas vezes desprezado. O que fica para a Sociedade nestes dois casos? O aluno que foi ajudado terá um futuro eventualmente mais seguro, ou a investigação do Professor servirá muito provavelmente só para ele ter currículo e subir na carreira. Não façam nada que não dê pontos, é o que parece ser o lema das avaliações, tal como o RAD. Quem monta um laboratório será recompensado? Quem apoia os alunos fora das suas obrigações mínimas é recompensado? Quem ajuda os colegas por ser mais antigo na carreira é recompensado? O ECDU recomenda que assim seja, mas se o RAD não o premeia, qual o incentivo?
É um mundo de números. No tempo do Salazar, o país acabou por ter enormes reservas de ouro e as contas que hoje fariam inveja a uma Alemanha. Mas a que custo? Não havia estradas, nem escolas que se comparassem às dos outros países. Não havia hospitais dignos desse nome. Hoje temos uma dívida que nos preocupa mas temos um Serviço Nacional de Saúde que faz inveja a muitos países desenvolvidos. Se não o tivessemos feito, a nossa dívida seria mais pequena, mas viveríamos como em muitos países e como há 40 anos atrás, com medo de ter um acidente ou doença porque não sairíamos vivos do hospital.
E se forem políticos não façam infraestruturas mas em vez disso façam discursos e usem e abusem da caridade que essa retira o orgulho a quem a recebe mas ao menos mantem-nos vivos e principalmente gratos; distribuam algumas mordomias pelos vossos eleitores e serão recompensados.
Voltando ao Ensino e I&D: Não façam nada demais, porque ninguém os vai recompensar, e sobretudo não façam nada pelos outros.

sábado, março 03, 2012

O meio ministro

Quem tutela o Ensino Superior e da Investigação Científica? Um Secretário de Estado. Juntos, Ensino Superior e Ciência e Economia não valem sequer um ministro inteiro. Estamos pior que antes quando tínhamos um ministro para o ensino superior e a Ciência. Ao menos tivemos novos estatutos com o RJIES e bem ou mal iniciou-se um processo de renovação da orgânica das Universidades e abriram-se perspetivas para uma auto-responsabilização da Universidades através de uma maior autonomia. Algumas até passaram a Fundações com plena autonomia. O resultado está á vista: tudo parado. O processo de passagem a fundação da UM está parado. A fusão do Técnico e da Universidade de Lisboa já vinha de trás, não havendo qualquer indício de com este governo haver incentivos para outras fusões. Se a UM quisesse entrar num processo semelhante, fusão com outra Universidade ou com um politécnico, já aqui referido, que apoio teria por parte dum ministério ausente? Muito pouco. Já basta não responder aos apelos dos reitores que com os cortes sofridos as Universidades não vão poder continuar como até aqui. Já sofremos de há alguns anos a esta parte nos departamentos a cortes que vão até ao papel higiénico. Agora com mais cortes, onde vai chegar? Os alunos nas engenharias e ciências, estarão muito e breve a ter só aulas teóricas, uma vez que as aulas laboratoriais necessitam de matérias primas, manutenção de equipamentos, técnicos de apoio (não substituídos depois de reformados), etc. Qual a moral de cobrar propinas cada vez mais elevadas em cursos de engenharia e ciências, com os cursos a deteriorarem-se de dia para dia? Um país sem educação de qualidade nestas áreas está a hipotecar o futuro. A engenharia e as ciências são a base duma economia saudável, embora há ministros que pensem que mais saudável ainda é vender pastéis de nata.

sábado, fevereiro 25, 2012

A fé de alguns países e a reacção de outros: a via da Irlanda no ensino (2)

Temos tido algumas demonstrações de fé nos últimos dias por parte dos nossos governantes: é a ministra do ambiente que diz que tem fé que chova e é o primeiro ministro que tem fé que em 2013 o país volte aos mercados sem recessão e com a economia a crescer. Nada disto é realista mas tem que se admirar a fé dos nossos governantes. Para muitos de nós também não há na verdade muito mais que se possa fazer senão esperar, e ter fé é uma forma de esperar... e não fazer nada para inverter a situação. A fé mantem-nos quietinhos tal como acreditar no destino nos desincentiva de atuar. É o fado dos portugueses. Outros países quando confrontados com a adversidade têm seguido caminhos mais reactivos, reagindo com energia e confiança, lutando com as armas que têm. Na economia temos o caso da Islândia que usou a sua pequenez para não pagar a divida dos seus bancos. Temos a Grécia que usa a força dos seus sindicatos para na rua combater o inevitável rolo espremedor da troika duma forma que não deixa dúvidas. Temos a Irlanda cuja economia cresce mesmo com a troika, o que se deve a uma governação imaginativa, mesmo sendo um país católico como Portugal. Na Irlanda o pragmatismo fala mais alto que a fé. Já aqui exprimi o que é reconhecido à Irlanda como vantagem sobre Portugal: a educação. Teríamos muito a aprender sobre o pragmatismo da educação na Irlanda, voltado para a indústria IT e muito focado na formação profissional, mais do que na formação teórica. A nossa educação pelo contrário forma doutores nos politécnicos por exemplo, quando devia formar técnicos altamente especializados. Nós na UM tivemos uma oportunidade de termos uma associação com politécnico o do Cávado e Ave e perdemo-la. Eles sozinhos não têm "guidance" nós na UM perdemos uma hipótese de ter cursos técnicos altamente especializados, virados para as novas indústrias. Talvez se tivéssemos um futuro conjunto teríamos condições para fazer essa viragem, e não esperar e ter fé que os nossos cursos se tornem mais relevantes apenas mudando os nomes altamente motivadores (mas sem interesse para a indústria). Os consórcios defendido pelo anterior governo faria sentido neste caso, pois parece-me haver uma complementaridade entre Universidades e Politécnicos. Os politécnicos teriam contudo que deixar de ser Universidades de segunda e passarem a ser politécnicos de primeira, com uma componente técnica muito maior que a que têm neste momento. Há excepções, mas o IPCA não me parece ser uma e a UM poderia promover essa diferença e complementaridade simultânea entre as duas instituições, também para seu próprio bem. Poder-se-ia, partilhar recursos, nomeadamente humanos, e beneficiar também por essa via, através do intercâmbio de experiências diversas dos seus docentes e técnicos