terça-feira, fevereiro 28, 2017
A I&D acomodada
Sucedem-se iniciativas por parte do governo para resolver problemas pendentes durante anos, como o futuro dos investigadores ou bolseiros, ou seja a estabilidade de emprego, e também o eterno fosso existente entre as instituições de ensino superior e as empresas, nomeadamente no que respeita à investigação que não é transferida para a economia do país. O problema é que quando se fazem as coisas para resolver depressa, há o risco de não se resolver nada e se arranjar ainda outros problemas, além do que se gasta que podia ser mais bem empregue de outra forma. No caso dos investigadores, o governo passou para as Universidades o ónus de fazer o estatuo de carreira do investigador, o que a Universidade do Minho já fez. O que este regulamento faz é de facto dar um emprego e uma carreira aos investigadores, o que agora é possível via a contratação pela via da Fundação, com contratos a termo certo. Até aqui tudo bem. Mas também contempla a hipótese de contratar por tempo indeterminado. Qual é a ideia? Ter um investigador a investigar toda a sua vida profissional, sem retorno aparente para a Universidade?
O que são umas publicações científicas para a UM e o País? Serão mais umas para a estatística. Se virmos depois os salários destes investigadores, designados por investigadores coordenadores, são semelhantes a um professor Associado. Mas o Professor dá aulas, forma licenciados, mestres e doutores, e faz investigação. Ás tantas tão ou mais relevante do que a do investigador produz. Há ainda outra questão. Lembram-se do INETI? Pois esta instituição era constituída por investigadores de carreira. Alguém se lembra de alguma desta investigação ter tido alguma relevância quando comparada com aquela efetuado por professores nas universidades? Não é comparável. Porquê? Porque um investigador não investiga por decreto, não investiga se não lhe apetecer porque recebe o ordenado na mesma e tendo contrato por tempo indeterminado, não pode ser dispensado, não correndo qualquer risco. Pode pura e simplesmente se não estiver inspirado não produzir quaisquer resultados o que é agravado por não dar aulas, nem produzir licenciados/mestres/doutores como o fazem os professores. Não seria melhor que o investigador passasse não a investigador coordenador mas que se candidatasse ao lugar de professor Auxiliar/Associado quando tivesse currículo para isso? Assim cobria as necessidades da Universidade, fazia investigação e dava aulas.
Em relação à transferência da I&D para a economia, vem o governo abrir concurso para os chamados Collaborative Laboratories, ou CoLabs. A ideia é aparentemente copiada da Europa e assim será financiada em grande parte pela Comunidade Europeia. Claro que está já direcionado para mais do mesmo, com algumas exceções. Mas á parte desse aspeto, que vai beneficiar alguns nomes conhecidos da praça, há ainda o ridículo de ser só necessário uma empresa como parceira do CoLab, segundo me apercebi de uma leitura breve do regulamento. Qual a validade dessa transferência de I&D quando é só para uma empresa? Na Europa há multinacionais que poderiam sozinhas fazer esse papel de representar uma fatia relevante do meio empresarial. Mas uma pequena e média empresa que é o que existe em Portugal, como representará o tecido económico português? Além de empresas podem ser hospitais e está-se mesmo a ver para que centros de investigação está destinado estes CoLabs. Mas o jornal Expresso deu um exemplo do Politécnico de Bragança, uma Professora que tinha tudo para compor um desses CoLab desenvolvendo a agricultura local, salvo erro. Até que é uma boa ideia. Mas já se sabe que vai ser antes do concurso fechar? Há outros que já se puseram de bicos de pés, a antever que podem novamente dirigir infraestruturas numa continuidade de colecionador de investigadores, projetos e consequentemente de currículo e prestígio continuado no País. A confusão jornalística sobre este assunto é grande derivado da falta de esclarecimento e clarividência por parte do governo. Fala-se em centros de transferência de tecnologia que pelos vistos fazem investigação, nos vários setores, têxtil, calçado, curtumes, por exemplo, e que serão munidos de instrumentos semelhantes aos Colabs. Tudo à pressa e numa perspetiva de resolver estes problemas da I&D aplicada que não é absorvida pela economia. Já lá diz o povo: depressa e quem não há quem.
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